Doença de Kawasaki 


Versão de 2016
diagnosis
treatment
causes
Kawasaki Disease
Doença de Kawasaki
Esta doença foi descrita pela primeira vez na literatura médica Inglesa, em 1967, por um pediatra Japonês chamado Tomisaku Kawasaki (a doença recebeu o seu nome)
evidence-based
consensus opinion
2016
PRINTO PReS



1. O QUE É A DOENÇA DE KAWASAKI

1.1 O que é?
Esta doença foi descrita pela primeira vez na literatura médica Inglesa, em 1967, por um pediatra Japonês chamado Tomisaku Kawasaki (a doença recebeu o seu nome). Identificou um grupo de crianças com febre, erupções cutâneas, conjuntivite (olhos vermelhos), enantema (vermelhidão da garganta e da boca), inchaço das mãos e dos pés e inchaço dos gânglios linfáticos do pescoço (ínguas). Inicialmente a doença foi designada por "síndrome mucocutâneo dos gânglios linfáticos". Alguns anos mais tarde, foram reportadas complicações cardíacas, tais como aneurismas (grande dilatação dos vasos sanguíneos) das artérias coronárias.
A doença de Kawasaki (DK) é uma vasculite sistêmica aguda, o que significa que existe inflamação nas paredes dos vasos sanguíneos, que pode evoluir para dilatação (aneurismas) em qualquer artéria de médio calibre, principalmente nas artérias coronárias. No entanto, a maioria das crianças apenas apresentará os sintomas agudos sem complicações cardíacas.

1.2 É uma doença comum?
A DK é uma doença rara, mas é uma das formas mais comuns de vasculite na infância, juntamente com a púrpura Henoch-Schoenlein. A doença de Kawasaki está descrita em todo o mundo, embora seja muito mais frequente no Japão. É quase exclusivamente uma doença de crianças pequenas. Cerca de 85% das crianças com DK têm menos de 5 anos, sendo a idade de pico de incidência aos 18 – 24 meses. Pacientes com idade inferior a 3 meses ou mais de 5 anos são encontradas menos frequentemente, mas apresentam em risco aumentado de aneurismas da artéria coronária (AAC). É mais comum nos rapazes do que nas raparigas. Embora os casos de DK possam ser diagnosticados ao longo de todo o ano, podem ocorrer algumas variações, com um aumento de casos no final do inverno e da primavera.

1.3 Quais são as causas da doença?
A causa da DK permanece incerta, embora se suspeite que uma origem infeciosa possa ser um evento desencadeador. Em certos indivíduos predispostos geneticamente, uma resposta de hipersensibilidade ou imunitária desordenada, provavelmente desencadeada por um agente infeccioso (alguns vírus ou bactérias), podem iniciar um processo inflamatório causando inflamação e lesões nos vasos sanguíneos.

1.4 É hereditária? Porque razão o meu filho(a) tem esta doença? O seu aparecimento pode ser prevenido? É infecciosa?
A DK não é uma doença hereditária, no entanto, suspeita-se que exista uma predisposição genética. É muito raro existir mais do que um membro da família com esta doença. Não é infecciosa nem pode ser transmitida de uma criança para outra Atualmente, não existe nenhuma prevenção conhecida. É possível, embora raro, ocorrer um segundo episódio da doença, no mesmo doente.

1.5 Quais são os principais sintomas?
A doença começa com febre sem causa aparente. A criança está normalmente muito irritada. A febre pode ser acompanhada ou seguida por uma conjuntivite (vermelhidão nos olhos), sem pus nem secreções. A criança pode apresentar vários tipos de erupção cutânea, semelhantes ao sarampo, escarlatina, urticária, pápulas, etc. A erupção cutânea afeta principalmente o tronco e as extremidades e, frequentemente, a área das fraldas, causando vermelhidão e descamação da pele.
Alterações na boca, podem incluir lábios muito vermelhos e rachados, língua vermelha, (frequentemente chamada de língua "de morango"), e vermelhidão da faringe. As mãos e os pés também podem ser afetados com inchaço e vermelhidão das palmas das mãos e dos pés. Os dedos das mãos e dos pés podem ficar inchados. Estes sintomas são seguidos por uma descamação característica na ponta dos dedos das mãos e dos pés (por volta da segunda ou terceira semana). Mais de metade dos pacientes apresentará gânglios linfáticos inchados no pescoço. É normalmente um gânglio linfático que mede, pelo menos, 1,5 cm.
Por vezes, outros sintomas tais como inchaço e/ou dor nas articulações, dor abdominal, diarreia, irritabilidade ou dores de cabeça, podem ser observados. Nos países onde a vacina BCG (proteção contra a tuberculose) é dada, as crianças menores podem apresentar vermelhidão na zona da cicatriz da vacina BCG.
O envolvimento cardíaco é a manifestação mais grave da DK, devido à possibilidade de surgirem complicações em longo prazo. Sopros cardíacos, arritmias ou anomalias identificadas por ecocardiograma, podem ser detetadas. Todas as diferentes camadas do coração podem apresentar algum grau de inflamação, como pericardite (inflamação da membrana que envolve o coração), miocardite (inflamação do músculo do coração) e alguns problemas nas válvulas cardíacas. No entanto, a principal característica desta doença é o desenvolvimento de aneurismas das artérias coronárias (AAC).

1.6 A doença é igual em todas as crianças?
A gravidade da doença varia de criança para criança. Nem todas as crianças apresentam todas as manifestações clínicas e a maioria dos pacientes não desenvolverá complicações cardíacas. Os aneurismas são observados em apenas 2 a 6 em cada 100 crianças em tratamento. Algumas crianças (especialmente crianças com menos de 1 ano de idade) apresentem frequentemente formas incompletas da doença, o que significa que não apresentam todas as manifestações clínicas típicas, tornando o diagnóstico mais difícil. Algumas destas crianças podem desenvolver aneurismas. São diagnosticados como tendo DK atípica.

1.7 A doença nas crianças é diferente da doença nos adultos?
Esta é uma doença tipicamente infantil embora existam casos raros de DK na idade adulta.


2. DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO

2.1 Como é diagnosticada?
A DK é uma doença de diagnóstico clínico ou de cabeceira. Isto significa que o diagnóstico é efetuado apenas com base numa avaliação clínica feita por um médico. Pode-se efetuar um diagnóstico definitivo se existir, durante pelo menos 5 dias, febre sem causa aparente e se esta for acompanhada de pelo menos 4 das 5 características seguintes: conjuntivite bilateral (i.e., inflamação da membrana que reveste o globo ocular), inchaço dos gânglios linfáticos, erupção cutânea, envolvimento da boca e da língua e alterações nas extremidades. O médico deve verificar que não existem evidências de qualquer outra doença que pudesse explicar os mesmos sintomas. Algumas crianças apresentam formas incompletas da doença, o que significa que apresentam poucos critérios clínicos, tornando o diagnóstico mais difícil. Estes casos são designados por DK incompleta.

2.2 Quanto tempo durará a doença?
A DK é uma doença com três fases: aguda, a qual inclui as 2 primeiras semanas durante as quais existe a febre e os outros sintomas; sub-aguda, da segunda à quarta semana, período no qual a quantidade de plaquetas começa a aumentar e os aneurismas podem aparecer; e a fase da recuperação, que vai do primeiro ao terceiro mês, quando todos os testes laboratoriais voltam ao normal e se resolvem ou diminuem algumas das anomalias nos vasos sanguíneos (tais como os AAC).
Se não for tratada, a doença pode passar por uma evolução auto-limitada durante cerca de 2 semanas, deixando as artérias coronárias danificadas inalteradas.

2.3 Qual a importância dos testes?
Atualmente, não existem testes laboratoriais que possam ajudar a diagnosticar conclusivamente a doença. Um conjunto de testes tais como a VHS (velocidade de sedimentação eritrocitária) elevada, nível de PCR elevada, leucocitose (número aumentado dos glóbulos brancos), anemia (diminuição dos glóbulos vermelhos), albumina sérica baixa e enzimas hepática elevadas podem ajudar a efetuar o diagnóstico. O número de plaquetas (as células envolvidas na coagulação do sangue) é geralmente normal durante a primeira semana da doença, mas começa a aumentar na segunda semana, atingindo contagens muito elevadas.
As crianças devem efetuar exames e análises sanguíneas periodicamente até que os valores das plaquetas e da VS voltem ao normal.
Um eletrocardiograma (ECG) e um ecocardiograma devem ser feitos logo na fase inicial da doença. O ecocardiograma pode detetar dilatações (alargamentos) ou aneurismas, através da avaliação da forma e do tamanho das artérias coronárias. No caso de uma criança com anormalidades coronárias, são necessários ecocardiogramas de acompanhamento e estudos e avaliações adicionais.

2.4 Há tratamento/cura para a doença?
A maioria das crianças com DK pode ser curada, no entanto, apesar de fazerem o tratamento adequado, alguns pacientes podem desenvolver complicações cardíacas. A doença não pode ser prevenida, mas a melhor forma de diminuir as complicações cardíacas é efetuar um diagnóstico precoce e iniciar o tratamento o mais rápido possível.

2.5 Quais são os tratamentos?
Uma criança com a doença ou indícios da DK deve ser hospitalizada para observação e monitorização e ser avaliada quanto à existência de eventuais problemas cardíacos.
Para diminuir a frequência de complicações cardíacas, o tratamento deve ser iniciado logo que o diagnóstico seja efetuado.
O tratamento consiste numa dose única de imunoglobulina intravenosa (IgIv) e aspirina ambas em doses elevadas. Este tratamento irá diminuir a inflamação, aliviando significativamente os sintomas agudos. A dose elevada de imunoglobulina intravenosa é a parte essencial do tratamento, uma vez que consegue diminuir a ocorrência de aneurismas, em grande parte dos pacientes. Embora muito caro, este tratamento continua, por enquanto, a ser a forma mais eficaz. Em pacientes com fatores de risco especiais, como a persistência da febre, podem ser administrados corticosteroides simultaneamente. Os pacientes que não respondem a uma ou a duas doses de imunoglobulina intravenosa dispõem de outras alternativas terapêuticas, incluindo corticosteroides intravenosos em doses elevadas e tratamento com agentes biológicos.

2.6 As crianças respondem todas à imunoglobulina intravenosa?
Felizmente, a maioria das crianças irá necessitar de apenas uma dose. As crianças que não respondem podem necessitar de uma segunda dose, ou de doses de corticosteroides. Em casos raros, podem ser dadas novas moléculas designadas por agentes biológicos.

2.7 Quais são os efeitos secundários da terapia medicamentosa?
O tratamento com imunoglobulina intravenosa é normalmente seguro e bem tolerado. Raramente ocorre inflamação das meninges (meningite assética).
Após o tratamento com imunoglobulina intravenosa, as vacinas vivas atenuadas devem ser adiadas. (Discuta cada vacina com o seu pediatra). A aspirina em doses elevadas pode provocar náuseas ou perturbações do estômago.

2.8 Que tratamento é recomendado após a imunoglobulina e doses elevadas de aspirina? Quanto tempo deve o tratamento durar?
Após a febre estabilizar (geralmente em 24-48 horas), a dose de aspirina poderá ser reduzida. A dose baixa de aspirina é mantida devido ao seu efeito nas plaquetas. Isto significa que as plaquetas não se agregarão. Este tratamento é útil para evitar a formação de trombos (coágulos de sangue) dentro dos aneurismas ou dos revestimentos internos dos vasos sanguíneos inflamados, uma vez que a formação de trombos no interior de um aneurisma ou vaso sanguíneo pode levar ao corte do fluxo sanguíneo para as áreas fornecidas pelos vasos sanguíneos (enfarte, a complicação mais perigosa da DK). A dose baixa de aspirina é mantida até à normalização dos marcadores inflamatórios e até se obter um ecocardiograma de acompanhamento normal. As crianças com aneurismas persistentes devem tomar aspirina ou outros medicamentos anti-coagulantes sob supervisão de um médico durante períodos de tempo mais longos.

2.9 A minha religião não me permite utilizar sangue nem produtos derivados de sangue. E os tratamentos não convencionais/complementares?
Nesta doença não se devem fazer tratamentos não convencionais. A imunoglobulina intravenosa é o tratamento comprovado de eleição. Os corticosteroides podem ser eficazes caso a imunoglubulina intravenosa não possa ser utilizada.

2.10 Quem está envolvido nos cuidados médicos da criança?
O pediatra, o cardiologista pediátrico e o reumatologista pediátrico podem tratar a fase aguda e efetuar o acompanhamento de crianças com DK. Nos locais onde não existe reumatologista pediátrico, o pediatra, juntamente com o cardiologista, devem monitorizar os pacientes, especialmente aqueles que tiveram envolvimento cardíaco.
2.11 Qual é a evolução a longo prazo (prognóstico) da doença?
Para a maioria dos pacientes, o prognóstico é excelente, uma vez que poderão ter uma vida normal, com um crescimento e um desenvolvimento normais.
O prognóstico dos pacientes com anomalias persistentes das artérias coronárias depende principalmente do desenvolvimento de estreitamento vascular (estenoses) e obstruções (oclusões). Podem estar propensos a problemas cardíacos no início da vida e podem necessitar de ficar sob os cuidados de um cardiologista experiente no cuidado a longo prazo de crianças com DK.


3. VIDA QUOTIDIANA

3.1 De que forma pode a doença afetar o dia a dia da criança e da sua família?
Se a doença não afetar o coração, a criança e a sua família têm geralmente uma vida normal. Embora a maioria das crianças com doença de Kawasaki recupere totalmente, pode demorar algum tempo até que o seu filho deixe de se sentir cansado e irritado.

3.2 E a escola?
Quando a doença está bem controlada, como é geralmente o caso utilizando os medicamentos atualmente disponíveis, e a fase aguda tiver terminado, a criança não deve ter nenhum problema em participar em todas as atividades tal como os seus colegas saudáveis. A escola para uma criança é o que o trabalho é para um adulto. Um lugar onde aprendem a tornarem-se pessoas independentes e produtivas. Os pais e os professores devem fazer tudo o que puderem para permitir que a criança participe nas atividades escolares de forma normal, de modo a que a criança não só seja bem-sucedida academicamente, como para ser também aceite e apreciada pelos colegas e adultos.

3.3 E em relação à prática de esportes?
A prática de esportes é um aspeto essencial da vida diária de qualquer criança. Um dos objetivos do tratamento é permitir que as crianças tenham uma vida normal na medida do possível e não se considerem diferentes dos seus colegas e amigos. Como tal, as crianças que não desenvolvem envolvimento cardíaco não terão qualquer restrição para a prática de esportes ou de qualquer outra atividade da vida diária. No entanto, as crianças com aneurismas coronários devem consultar um cardiologista pediátrico quanto à possibilidade de participar em atividades de competição, especialmente durante a adolescência.

3.4 E em relação à alimentação?
Não existem evidências de que a alimentação possa influenciar a doença. De um modo geral, a criança deve seguir uma alimentação variada e adequada para a sua idade. Uma alimentação saudável e bem equilibrada com proteínas, cálcio e vitaminas suficientes é recomendada para uma criança em crescimento. Os pacientes tratados com corticosteroides devem evitar comer em excesso, uma vez que estes medicamentos podem aumentar o apetite.

3.5 A criança pode ser vacinada?
Após o tratamento com imunoglobulina intravenosa, as vacinas vivas atenuadas devem ser adiadas de acordo com as orientações dadas pelo médico.
O médico deverá decidir que vacinas a criança pode receber, considerando caso a caso. No geral, as vacinas não parecem aumentar a atividade da doença e causar efeitos adversos graves em pacientes com DK. As vacinas inativadas parecem ser seguras nos pacientes com DK, mesmo nos pacientes tratados com medicamentos imunossupressores, embora a maioria dos estudos seja incapaz de avaliar totalmente os danos raros induzidos pela vacinação.
Os pacientes tratados com doses elevadas de medicamentos imunossupressores deverão ser aconselhados pelo seu médico a medir as concentrações de anticorpos específicos contra o agente patogénico após a vacinação.


 
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