Síndromes de dor nos membros 


Versão de 2016
diagnosis
treatment
causes
Limb Pain Syndromes
Síndromes de dor nos membros
Síndrome de dor crónica generalizada, síndrome de dor regional complexa tipo 1, eritromelalgia, dores de crescimento, síndrome de hipermobilidade benigna, sinovite transitória, dor patelo-femoral - dor no joelho, deslizamento da epífise femoral capital, osteocondrose
evidence-based
consensus opinion
2016
PRINTO PReS
1. Introdução
2. Síndrome de Dor Crónica Generalizada (anteriormente chamada de Síndrome de Fibromialgia Juvenil)
3. Síndrome de Dor Regional Complexa Tipo 1
(Sinónimos: Distrofia Simpática Reflexa, Síndrome de Dor Músculoesquelética Idiopática localizada)

4. Eritromelalgia
5. Dores de Crescimento
6. Síndrome de Hipermobilidade Benigna
7. Sinovite Transitória
8. Dor patelo-femoral - dor no joelho
9. Deslizamento da Epífise Femoral Capital
10. Osteocondrose (sinónimos: osteonecrose, necrose avascular)



1. Introdução

Muitas doenças pediátricas podem causar dores nos membros. O nome Síndrome de Dor nos Membros é um termo genérico para um grupo de diferentes condições médicas com causas e apresentações clínicas muito diferentes que partilham a presença contínua ou intermitente de dor nos membros. Para dar este diagnóstico, os médicos realizam exames à procura de doenças conhecidas, incluindo as doenças graves que podem causar dores nos membros.


2. Síndrome de Dor Crónica Generalizada (anteriormente chamada de Síndrome de Fibromialgia Juvenil)

2.1 O que é?
A fibromialgia pertence ao grupo "Síndrome de dor músculoesquelética amplificada". A fibromialgia é uma síndrome caracterizada por dor músculoesquelético generalizada de longa duração, envolvendo as extremidades superiores e inferiores, assim como as costas, abdómen, peito, pescoço e/ou maxilares durante pelo menos 3 meses, combinada com fadiga, sono pouco reparador e problemas de intensidade variável ao nível da atenção, resolução de problemas, raciocínio ou memória.

2.2 É uma doença comum?
A fibromialgia ocorre principalmente em adultos. Na pediatria, é reportada predominantemente em adolescentes, com uma frequência de cerca de 1%.
O sexo feminino é frequentemente mais afetado do que o sexo masculino. As crianças com esta doença partilham muitas características clínicas com as crianças pela síndrome de dor regional complexa.

2.3 Quais são as características clínicas típicas?
Os doentes queixam-se de dor difusa nos membros, embora a gravidade da dor possa variar de criança para criança. A dor pode afetar qualquer parte do corpo (extremidades superiores e inferiores, costas, abdómen, peito, pescoço e maxilares).
As crianças com esta doença têm geralmente problemas de sono e a sensação de despertar de um sono pouco reparador. Outra das principais queixas é a fadiga intensa, acompanhada de diminuição da capacidade física.
Os doentes com fibromialgia referem frequentemente dores de cabeça, inchaço dos membros (existe uma sensação de inchaço embora não possa ser observado nenhum inchaço), dormência e, por vezes, uma cor azulada dos dedos. Estes sintomas causam ansiedade, depressão e muitas faltas à escola.

2.4 Como é diagnosticada?
O histórico de dor generalizada em pelo menos 3 áreas do corpo, com uma duração superior a 3 meses, juntamente com um grau variável de fadiga, sono pouco reparador e sintomas cognitivos (atenção, aprendizagem, raciocínio, memória, tomada de decisão e capacidades de resolução de problemas) é diagnóstico. Muitos doentes apresentam pontos doridos nos músculos (pontos desencadeadores) em determinados locais, embora este sinal não seja necessário para o diagnóstico.

2.5 Como pode ser tratada?
Uma questão importante é diminuir a ansiedade gerada por esta doença, explicando aos doentes e aos seus familiares que embora a dor seja grave e real, não existem nem danos nas articulações, nem nenhuma doença física grave.
A abordagem mais importante e eficaz é um programa progressivo de fitness cardiovascular, e a natação é o melhor exercício. A segunda questão é iniciar uma terapia cognitiva comportamental, individualmente ou em grupo. Finalmente, alguns doentes podem necessitar de um tratamento com medicamentos para melhorar a qualidade do sono.

2.6 Qual é o prognóstico?
A recuperação total requer grandes esforços por parte do doente e o apoio da família é essencial. Geralmente, o resultado nas crianças é muito melhor do que nos adultos, e a maioria recupera. O cumprimento de um programa de exercícios físicos periódico é muito importante. Apoio psicológico, assim como medicação para dormir, para a ansiedade e para a depressão podem ser indicados para os adolescentes.


3. Síndrome de Dor Regional Complexa Tipo 1
(Sinónimos: Distrofia Simpática Reflexa, Síndrome de Dor Músculoesquelética Idiopática localizada)


3.1 O que é?
É uma dor extremamente grave nos membros de causa desconhecida e frequentemente associada a alterações cutâneas.

3.2 É uma doença comum?
A frequência é desconhecida. É mais comum em adolescentes (a idade média de início da doença é por volta dos 12 anos) e nas raparigas.

3.3 Quais são os principais sintomas?
Geralmente, existe um longo histórico de dor muito intensa nos membros que não responde a diferentes tratamentos e que aumenta ao longo do tempo. Frequentemente, resulta em incapacidade de utilizar o membro afetado.
As sensações que são indolores para a maioria das pessoas, tais como um ligeiro toque, podem ser extremamente dolorosas nas crianças afetadas. Esta estranha sensação chama-se "alodinia".
Estes sintomas interferem com as atividades diárias das crianças afetadas, que geralmente faltam muitos dias à escola.
Ao longo do tempo, um subconjunto de crianças desenvolve alterações na cor da pele (manchas pálidas ou roxas), na temperatura (normalmente reduzida) ou na transpiração. Também pode existir inchaço do membro. A criança pode por vezes manter o membro em posições invulgares, recusando fazer qualquer movimento.

3.4 Como é diagnosticada?
Até há alguns anos atrás, estas síndromes tinham nomes diferentes, mas atualmente, os médicos referem-se a elas como síndromes de dor regional complexa. São utilizados critérios diferentes para diagnosticar a doença.
O diagnóstico é clínico, baseado nas características da dor (grave, prolongada, atividade limitada, falta de resposta ao tratamento, presença de alodinia) e no exame físico.
A combinação das queixas com os exames clínicos é bastante característica. O diagnóstico requer que sejam excluídas outras doenças, as quais geralmente podem ser geridas por médicos de cuidados primários, clínicos gerais ou pediatras, antes do encaminhamento para um reumatologista pediátrico. Os estudos laboratoriais são padrão. Uma ressonância magnética (RM) pode mostrar alterações inespecíficas dos ossos, das articulações e dos músculos.

3.5 Como pode ser tratada?
A melhor abordagem é um programa terapêutico de exercício físico intenso supervisionado por fisioterapeutas e terapeutas ocupacionais, com ou sem tratamento psicológico. Têm sido utilizados outros tratamentos, isoladamente ou em combinação, incluindo antidepressivos, biofeedback, estimulação nervosa elétrica transcutânea e alteração comportamental, sem resultados definitivos. Os analgésicos (medicamentos para a dor) são geralmente ineficazes. Estão atualmente em curso investigações e espera-se que surjam tratamentos futuros uma vez que as causas estão identificadas. O tratamento é difícil para todas as pessoas envolvidas: as crianças, a família e a equipa de tratamento. É geralmente necessária intervenção psicológica devido ao stress causado pela doença. Entre as principais causas de insucesso do tratamento encontram-se a dificuldade por parte da família em aceitar o diagnóstico e o cumprimento das recomendações de tratamento.

3.6 Qual é o prognóstico?
Esta doença tem um prognóstico melhor nas crianças do que nos adultos. Além disso, a maioria das crianças recupera mais rapidamente do que os adultos. No entanto, é demorado e o tempo até à recuperação varia amplamente de criança para criança. Um diagnóstico e intervenção precoces levam a um melhor prognóstico.

3.7 E em relação à vida diária?
As crianças devem ser incentivadas a manter atividades físicas, a frequentar a escola periodicamente e a brincar com os seus colegas.


4. Eritromelalgia

4.1 O que é?
Também é chamada de "eritermalgia". O nome desta doença deriva de três palavras Gregas: erythros (vermelho), melos (membro) e algos (dor). É extremamente rara, porém pode ocorrer em famílias. A maioria das crianças tem cerca de 10 anos de idade quando começam a apresentar queixas. É mais frequente nas raparigas.
As queixas incluem uma sensação de ardor, com os pés quentes, vermelhos e inchados ou, menos frequentemente, as mãos. Os sintomas pioram após exposição ao calor e são aliviados com arrefecimento das extremidades, ao ponto que algumas crianças se recusam a tirar os pés da água gelada. A evolução não melhora. Evitar o calor e o exercício físico vigoroso parecem ser as medidas de controlo mais úteis.
Podem ser utilizados muitos medicamentos diferentes numa tentativa de aliviar a dor, incluindo medicamentos anti-inflamatórios, analgésicos e medicamentos para melhorar a circulação sanguínea (chamados "vasodilatadores"). Um médico irá prescrever o que mais se adequar a cada criança.


5. Dores de Crescimento

5.1 O que é?
Dores de crescimento é um termo benigno que se refere a um padrão característico de dor nos membros, o qual geralmente ocorre em crianças entre os 3 e 10 anos de idade. É também chamada de "dor benigna dos membros da infância" ou "dores noturnas recorrentes dos membros".

5,2. É uma doença comum?
As dores de crescimento são uma queixa comum em idade pediátrica. Apresenta uma frequência semelhante nos rapazes e nas raparigas, afetando entre 10 a 20% das crianças em todo o mundo.

5.3 Quais são os principais sintomas?
A dor aparece principalmente nas pernas (tíbia, barriga da perna, coxas ou na parte de trás dos joelhos) e é geralmente bilateral. Aparece no final do dia ou da noite, acordando muitas vezes a criança. Geralmente, os pais referem que a dor ocorre após atividades físicas.
Os episódios de dor duram normalmente entre 10 a 30 minutos, embora possa variar entre minutos a horas. A intensidade pode ser ligeira ou muito grave. As dores de crescimento são intermitentes, com intervalos sem dor que podem durar entre dias a meses. Em alguns casos, os episódios de dor podem ocorrer diariamente.

5.4 Como é diagnosticada?
O padrão característico de dor, combinado com a ausência de sintomas matinais e com um exame físico normal, permite estabelecer o diagnóstico. Regra geral, os resultados dos estudos laboratoriais e os Raios-X estão sempre normais. No entanto, pode ser necessário efetuar Raios-X para excluir outras patologias.

5.5 Como pode ser tratada?
Explicar a natureza benigna do processo reduz a ansiedade da criança e da família. Durante os episódios de dor, uma massagem local, a aplicação de calor e a utilização de analgésicos suaves pode ajudar. Nas crianças com episódios frequentes, uma dose noturna de ibuprofeno pode ser útil para controlar os episódios de dor mais intensos.

5.6 Qual é o prognóstico?
As dores de crescimento não estão associadas a nenhuma doença orgânica grave e geralmente resolvem-se espontaneamente no final da infância. Em 100% das crianças, a dor desaparece à medida que envelhecem.


6. Síndrome de Hipermobilidade Benigna

6.1 O que é?
Hipermobilidade refere-se às crianças que têm articulações flexíveis ou com folga. É também chamado de lassidão articular. Algumas crianças podem sentir dor. A Síndrome de Hipermobilidade Benigna (SHB) refere-se às crianças que apresentam dor nos membros devido ao aumento da mobilidade (amplitude de movimento) das articulações, sem ter associada qualquer doença dos tecidos conjuntivos. Como tal, a SHB não é uma doença, mas sim uma variação da regra.

6.2 É uma doença comum?
A SHB é uma doença extremamente comum em crianças e jovens, existindo em 10 a 30% das crianças com idade inferior a 10 anos e particularmente nas raparigas. A sua frequência diminui com a idade. Ocorre frequentemente em famílias.

6.3 Quais são os principais sintomas?
Frequentemente, a hipermobilidade tem como resultado dores profundas, intermitentes e recorrentes no final do dia ou à noite nos joelhos, pés e/ou tornozelos. Nas crianças que tocam piano, violino, etc., pode afetar os dedos. A atividade e o exercício físico podem desencadear ou aumentar a dor. Raramente, pode existir um inchaço ligeiro nas articulações.

6.4 Como é diagnosticada?
O diagnóstico é efetuado com base num conjunto pré-definido de critérios que quantificam a mobilidade articular e a ausência de outros sinais de doenças do tecido conjuntivo.

6.5 Como pode ser tratada?
Raramente é necessário tratamento. Se a criança praticar desportos nos quais são frequentes impactos tais como futebol ou ginástica, e desenvolver entorses/distensões, deverá ser efetuado um fortalecimento muscular e proteção das articulações (ligaduras elásticas ou funcionais, cintas).

6.6 E em relação à vida diária?
A hipermobilidade é uma doença benigna, que tende a desaparecer com a idade. As famílias devem estar cientes de que o seu principal risco resulta de impedir as crianças de viver uma vida normal.
As crianças devem ser incentivadas a manter um nível de atividade normal, incluindo praticarem qualquer desporto que seja do seu interesse.


7. Sinovite Transitória

7.1 O que é?
A sinovite transitória é uma inflamação ligeira (pequena quantidade de líquido no interior da articulação), de causa desconhecida, da articulação da anca que se resolve por si só não deixando nenhuma sequela.

7.2 É uma doença comum?
É a causa mais comum de dor na anca em idade pediátrica. Afeta 2 a 3% das crianças com idades entre os 3 e 10 anos. É mais comum nos rapazes (uma rapariga por cada 3-4 rapazes).

7.3 Quais são os principais sintomas?
Os principais sintomas são dor na anca e na coxa. Pode existir dor na anca assim como dor nas virilhas, coxa ou, ocasionalmente, nos joelhos, geralmente de início súbito. A manifestação mais comum é uma criança acordar e começar a coxear ou recusar-se a andar.
7.4 Como é diagnosticada?
O exame físico é característico: um coxear com um movimento diminuído e doloroso da anca numa criança sem febre com mais de 3 anos de idade, que não parece estar doente. Ambas as ancas estão afetadas em 5% dos casos. Os Raios-X da anca geralmente apresentam resultados normais e, de um modo geral, não são necessários. Por outro lado, uma ecografia da anca é muito útil na deteção de sinovite da anca.

7.5 Como pode ser tratada?
A base do tratamento é o repouso, o qual deve ser proporcional ao grau de dor. Os medicamentos anti-inflamatórios não-esteroides podem ajudar a diminuir a dor e a inflamação. Geralmente, a dor desaparece após uma média de 6 a 8 dias.

7.6 Qual é o prognóstico?
O prognóstico é excelente com uma recuperação total em 100% das crianças (é transitório por definição). Caso os sintomas persistam durante mais de 10 dias, deve ser considerada uma doença diferente. Não é invulgar desenvolver novos episódios de sinovite transitória. Estes episódios são geralmente mais ligeiros e com uma duração inferior à do primeiro episódio.


8. Dor patelo-femoral - dor no joelho

8.1 O que é?
A dor patelo-femoral é a síndrome de utilização excessiva mais comum em idade pediátrica. As doenças deste grupo resultam de movimentos repetitivos ou lesões associadas a exercícios contínuos de uma determinada parte do corpo, em particular das articulações e tendões. Estas doenças são muito mais comuns em adultos (cotovelo do tenista ou golfista, síndrome do túnel cárpico, etc.) do que em crianças.
A dor patelo-femoral refere-se ao desenvolvimento de dor na parte anterior do joelho com atividades que exerçam carga adicional sobre a articulação patelo-femoral (a articulação formada pela superfície do joelho (rótula) e a parte inferior do fémur ou osso da coxa).
Quando a dor no joelho é acompanhada por alterações no tecido da superfície interna (cartilagem) da rótula, é utilizado o termo médico "condromalácia da rótula" ou "condromalácia rotuliana".
Existem muitos sinónimos para a dor patelo-femoral: síndrome patelo-femoral, dor anterior do joelho, condromalácia da rótula, condromalácia rotuliana.

8.2 É uma doença comum?
É muito rara em crianças até aos 8 anos de idade, tornando-se progressivamente mais comum nos adolescentes. A dor patelo-femoral é mais comum nas raparigas. Também pode ser mais comum em crianças com angulação significativa dos joelhos como por exemplo joelhos valgos (geno valgo) ou pernas arqueadas (geno varo), assim como nas crianças com doenças da rótula devidas a desalinhamento e instabilidade.

8.3 Quais são os principais sintomas?
Os sintomas característicos são dor na parte anterior no joelho que piora com atividades como correr, subir ou descer escadas, baixar ou saltar. A dor também é agravada pela posição sentada prolongada com o joelho dobrado.

8.4 Como é diagnosticada?
A dor patelo-femoral em crianças saudáveis é um diagnóstico clínico (testes laboratoriais ou estudos de imagiologia não são necessários). A dor pode ser reproduzida por compressão da rótula ou restringindo o movimento ascendente da rótula quando os músculos da coxa (quadricípites) estão contraídos.

8.5 Como pode ser tratada?
Na maioria das crianças sem doenças associadas (tais como transtornos de angulação dos joelhos ou instabilidade da rótula), a dor patelo-femoral é uma doença benigna que se resolve por si só. Caso a dor interfira com a prática de desportos ou com as atividades diárias, a iniciação de um programa de fortalecimento do quadricípites pode ajudar. A aplicação de sacos de gelo pode aliviar a dor após a prática de exercício físico.

8.6 E em relação à vida diária?
As crianças devem ter uma vida normal. O seu nível de atividade física deve ser ajustado de modo a mantê-las sem dor. As crianças muito ativas podem utilizar uma joelheira com uma cinta rotuliana.


9. Deslizamento da Epífise Femoral Capital

9.1 O que é?
Esta doença é um deslocamento da cabeça do fémur através da placa de crescimento; a sua causa é desconhecida. A placa de crescimento é uma porção de cartilagem existente entre os tecidos ósseos da cabeça femoral. É a parte mais fraca dos ossos e permite-lhes crescer. Quando a placa é mineralizada transforma-se em osso e os ossos param de crescer.

9.2 É uma doença comum?
É uma doença rara que afeta 3-10 em cada 100.000 crianças. É mais frequente nos adolescentes e nos rapazes. A obesidade parece ser um fator de predisposição.

9.3 Quais são os principais sintomas?
Os principais sintomas são coxear, dor na anca e diminuição da mobilidade da anca. A dor pode ser sentida na parte superior (dois terços) ou inferior (um terço) da coxa, e aumenta com a atividade física. Em 15% das crianças, a doença afeta as duas ancas.

9.4 Como é diagnosticada?
O exame físico é característico, apresentando uma diminuição da mobilidade da anca. O diagnóstico é confirmado por Raios-X, preferencialmente na vista axial ("frog-leg").

9.5 Como pode ser tratada?
Esta doença é considerada uma emergência ortopédica e requer fixação cirúrgica (estabilização da cabeça femoral por inserção de pinos para a manter fixa na sua posição).

9.6 Qual é o prognóstico?
Depende de quanto tempo a cabeça femoral permaneceu na posição deslizada antes de o diagnóstico ser efetuado e do grau de deslizamento. Isto varia de criança para criança.


10. Osteocondrose (sinónimos: osteonecrose, necrose avascular)

10.1 O que é?
A palavra "osteocondrite" significa "morte óssea". Refere-se a um grupo diverso de doenças de causa desconhecida, caracterizadas pela interrupção do fluxo sanguíneo para o centro de ossificação dos ossos afetados. No nascimento, os ossos são constituídos principalmente por cartilagem, um tecido mais suave que, ao longo do tempo, é substituído por um tecido mais mineralizado e resistente (o osso). Esta substituição tem início em locais específicos dentro de cada osso, áreas conhecidas como centros de ossificação, espalhando-se para o resto do osso ao longo do tempo.
A dor é o principal sintoma destas doenças. A doença tem nomes diferentes em função do osso afetado.
O diagnóstico é confirmado através de estudos de imagiologia. Os Raios-X mostram, em sequência, fragmentação ("ilhas" no interior do osso), colapso (repartição), esclerose (densidade aumentada, o osso parece "mais branco" nos vídeos) e, frequentemente, re-ossificação (formação de osso novo) com reconstituição do contorno ósseo.
Embora possa parecer uma doença grave, é bastante comum nas crianças e, com exceção de um possível envolvimento extenso da anca, tem um excelente prognóstico. Algumas formas de osteocondrose são tão comuns que são consideradas uma variação normal do desenvolvimento ósseo (doença de Sever). Podem ser incluídas outras doenças no grupo de "síndromes de utilização excessiva" (doenças de Osgood-Schlatter, Sinding-Larsen-Johansson).

10.2 Doença de Legg-Calvé-Perthes
10.2.1 O que é?
Esta doença envolve necrose avascular da cabeça femoral (a parte do osso da coxa mais próxima da anca).

10.2.2 É uma doença comum?
Não é uma doença comum, é reportada em 1/10.000 crianças. É mais frequente nos rapazes (4-5 rapazes por cada rapariga) entre os 3 e 12 anos de idade e ocorre principalmente em crianças com idades entre os 4 e 9 anos.

10.2.3 Quais são os principais sintomas?
A maioria das crianças apresenta coxear e graus de dor na anca variáveis. Por vezes, pode não existir qualquer dor. Geralmente, apenas uma anca está afetada, mas em cerca de 10% dos casos a doença é bilateral.

10.2.4 Como é diagnosticada?
A mobilidade da anca está afetada e pode ser dolorosa. Os Raios-X podem apresentar resultados normais no início mas posteriormente evidenciam a progressão descrita na introdução. A cintigrafia óssea e a ressonância magnética detetam a doença mais cedo do que os Raios-X.

10.2.5 Como pode ser tratada?
As crianças com doença de Legg-Calvé-Perthes devem ser sempre encaminhadas para um departamento de ortopedia pediátrica. A imagiologia é essencial para o diagnóstico. O tratamento depende da gravidade da doença. Em casos muito ligeiros, a observação pode ser suficiente, uma vez que o osso cicatriza por si só, com poucas sequelas.
Nos casos mais graves, o objetivo do tratamento é manter a cabeça femoral afetada dentro da articulação da anca, de modo a que quando a formação de osso novo começar, a cabeça femoral recupere a sua forma esférica.
Este objetivo pode ser alcançado em grau variável utilizando um aparelho de abdução (em crianças mais jovens) ou remodelando cirurgicamente o fémur (osteotomia, corte de uma parte de osso para manter a cabeça do fémur numa posição melhor) (em crianças mais velhas).

10.2.6 Qual é o prognóstico?
O prognóstico depende da extensão do envolvimento da cabeça femoral (quanto menor, melhor), assim como da idade da criança (melhor se for inferior a 6 anos). A recuperação total demora entre 2 a 4 anos. De um modo geral, cerca de dois terços das ancas afetados têm um bom resultado anatómico e funcional a longo prazo.

10.2.7 E em relação à vida diária?
As limitações nas atividades diárias dependem do tratamento aplicado. As crianças sob observação devem evitar impactos fortes na anca (saltar, correr). No entanto, devem continuar a ter uma vida escolar normal e a participar em todas as outras atividades que não envolvam suportar pesos pesados.

10.3 Doença de Osgood-Schlatter
Esta doença resulta de traumas repetidos no centro de ossificação da tuberosidade tibial (uma pequena crista óssea existente na parte superior da perna) causados pelo tendão rotuliano. Está presente em cerca de 1% dos adolescentes e é mais comum em indivíduos que praticam desporto.
A dor piora com atividades tais como a correr, saltar, subir e descer escadas e ajoelhar. O diagnóstico é estabelecido através do exame físico, com uma sensibilidade ou dor muito característica, por vezes acompanhada de inchaço, no local da inserção do tendão rotuliano na tíbia.
Os Raios-X podem ser normais ou apresentar pequenos fragmentos de osso na tuberosidade da tíbia. O tratamento envolve o ajuste do nível de atividade de modo a manter os doentes sem dor, a aplicação de sacos de gelo após a prática de desporto e descanso. A doença desaparece ao longo do tempo.

10.4 Doença de Sever
Esta doença também é chamada de "apofisite calcânea". É uma osteocondrite da apófise do calcâneo do osso do calcanhar, provavelmente relacionada com a tração do tendão de Aquiles.
É uma das causas mais comuns de dor no calcanhar em crianças e adolescentes. Tal como outras formas de osteocondrite, a doença de Sever está relacionada com a atividade e é mais comum em doentes do sexo masculino. O seu aparecimento ocorre geralmente por volta dos 7-10 anos de idade, manifestando-se com dor no calcanhar e, ocasionalmente, com a criança a coxear após a prática de exercício físico.
O diagnóstico é efetuado através do exame clínico. Não existe necessidade de nenhum tratamento além do ajuste do nível de atividade de modo a manter a criança sem dor. Caso esta abordagem não funcione, pode utilizar uma almofada no calcanhar. A doença desaparece ao longo do tempo.

10.5 Doença de Freiberg
Esta doença descreve a osteonecrose da cabeça do segundo osso metatársico no pé. A sua causa é provavelmente o trauma. É uma doença rara e na maioria dos casos envolve adolescentes do sexo feminino. A dor aumenta com a atividade física. O exame físico mostra sensibilidade sob a cabeça do segundo metatarso e, ocasionalmente, inchaço. O diagnóstico é confirmado por Raios-X, embora possa demorar duas semanas após o início dos sintomas até que as alterações sejam detetáveis. O tratamento inclui repouso e uma almofada metatársica.

10.6 Doença de Scheuermann
A doença de Scheuermann ou "cifose juvenil (curvatura da coluna)" é uma osteonecrose da apófise do anel do corpo vertebral (o osso localizado na periferia da parte superior e inferior de cada vértebra). É mais frequente nos adolescentes do sexo masculino. A maioria das crianças com esta doença tem uma má postura, com ou sem dor nas costas. A dor está relacionada com a atividade e pode ser aliviada através de repouso.
Suspeita-se do diagnóstico após observação (angulação acentuada nas costas) e confirmado por Raios-X.
Para ser diagnosticada com doença de Scheuermann, a criança deve apresentar irregularidades nas placas vertebrais e "encunhamento" de 5 graus em pelo menos três vértebras consecutivas.
Geralmente, a doença de Scheuermann não necessita de tratamento além do ajuste do nível de atividade da criança, observação e, em casos graves, de órtese.


 
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